© Clara Vieira Rodrigues

Com mãos e cabeça (e poucos ecrãs)!

No Clube Criativo da IA (CrIA), as crianças deixam de ser apenas utilizadoras passivas da tecnologia para se tornarem criadoras ativas. São convidadas a explorar e a brincar com o universo tecnológico — em especial com a inteligência artificial (IA) — de forma divertida e envolvente, enquanto desenvolvem o pensamento computacional e dialogam com referências da arte contemporânea.

Acreditamos que a melhor forma de aprender é experimentando. Por isso, as atividades do CrIA seguem uma abordagem hands-on, baseada em metodologias participativas, onde o tempo de ecrã é reduzido ao mínimo e o foco está na experimentação prática, na co-criação com materiais diversos e na colaboração entre pares e com a tecnologia.

De forma ativa, criativa e divertida, as crianças descobrem as tecnologias que moldam e moldaram o nosso presente e desenvolvem competências essenciais como a literacia digital, de media, visual e tecnológica, através do pensamento crítico, da imaginação e da expressão criativa. Brincar com ideias, co-criar com algoritmos e materiais, promovendo uma relação saudável, crítica e informada com a tecnologia.

Assente no aprender através do brincar (play-based learning), na arte, no design thinking e em metodologias de co-criação, o CrIA promove o empoderamento da criança. Num ambiente inclusivo, divertido e estimulante, as crianças exploram conceitos e materiais diversos, desenvolvem diálogo e constroem colaboração, compreendendo melhor o mundo tecnológico que as rodeia.

O que vão aprender e de que forma?

O nosso currículo, criado a partir de um modelo de design piloto baseado em quatro áreas interligadas, foi desenhado para equipar as mentes curiosas com competências essenciais para o futuro.

© Clara Vieira Rodrigues

Criança, as suas competências, cultura, interesses, necessidades e direitos;
Sociedade, os temas sociais e acontecimentos;
Artes, conhecimento, expressão e competências das disciplinas artísticas, bem como estratégias, materiais e técnicas;
Tecnologia, o seu efeito transformativo nos vários domínios e o seu impacto social e humano;

As Mãos e a Tecnologia: As crianças vão interagir diretamente com ferramentas de IA através de jogos e projetos práticos. Vão treinar modelos de IA e aprender como a tecnologia é construída e como funciona, explorando de forma lúdica a colaboração entre humanos e máquinas. Irão também conhecer as tecnologias analógicas e entender o processo que levou até à tecnologia que usam hoje.

A Cabeça e a Criatividade: O CrIA destaca a IA como uma poderosa ferramenta de co-criação. Através de processos de design, as crianças vão co-criar com algoritmos, entendendo que a IA é um processo lógico e matemático, criado por pessoas e passível de erro. Pretende-se que as crianças ganhem capacidade crítica em relação à tecnologia e que a consigam entender e usar com consciência, propósito e consequência.

A Sociedade e o Mundo: Vamos ajudar as crianças a desenvolver um olhar crítico sobre a tecnologia que as rodeia. De forma simples e acessível vão aprender sobre as implicações éticas da IA generativa, desde os algoritmos de recomendação até aos assistentes de voz e agentes de conversação e companheiros virtuais, mantendo sempre a simplicidade e a identificação.

A Aventura Completa: Quando os quatro elementos (Criança, Tecnologia, Artes e Sociedade) se unem, as crianças terão a oportunidade de construir uma compreensão profunda e crítica da IA, promovendo uma relação saudável, consciente e informada com a tecnologia. O CrIA vai ligar diretamente conceitos de arte e tecnologia com a cultura da criança e abordar questões actuais complexas de forma criativa e adequada às suas idades. O foco não está na ferramenta ou na tecnologia, mas na ação, na co-criação, na comunicação e no pensamento crítico.

Porquê Inteligência Artificial?

Falar de IA está na moda, é tema de conversa em todo o lado. A tecnologia traz inovações incríveis, mas também levanta preocupações legítimas sobre o seu impacto no presente e no futuro, na educação, na criatividade, nos direitos e no mercado de trabalho. Parafraseando o neurologista Alexandre Castro Caldas, temos de aprender a brincar com a tecnologia e ver como a usamos a sério. As crianças devem ser preparadas não apenas para o sucesso académico, mas também para a participação bem informada numa sociedade cada vez mais tecnológica e digitalizada.

A educação sobre a forma como usamos estas ferramentas e a promoção do facto de que o cérebro precisa de se desenvolver de um modo mais analógico são fundamentais” — Nataliya Kosmyna (investigadora do MIT)

Ao participarem nas nossas atividades, as crianças:

Entendem como funciona a tecnologia: Aprendem como a tecnologia evoluiu até hoje e que a IA é um conjunto de algoritmos criados por pessoas. Constroem um pensamento crítico em relação à tecnologia.
Identificam os seus limites e desenvolvem a empatia: Descobrem que a IA pode ter preconceitos (bias) e como esses erros podem ser corrigidos para uma tecnologia mais inclusiva.
Aprendem a entender a informação falsa: Desenvolvem a habilidade de validar a informação, distinguir desinformação e factos de ficção.
Vão para além do ecrã: Exploram a IA de forma tangível, com as mãos, através de conceitos e usando materiais diversos, enquanto desenvolvem o pensamento computacional. Aprendem a usá-la e a privilegiar uma tecnologia que lhes permita serem ativos.
Desenvolvem o pensamento crítico e interagem em segurança: Questionam, experimentam e colaboram para construir uma relação saudável, segura e informada com a tecnologia.
Transformam-se nos pensadores e criadores do futuro da tecnologia: capazes de usar a tecnologia a seu favor e a favor da sociedade, com responsabilidade e sentido crítico.

O objectivo é que crianças desenvolvam as sete competências essenciais de literacia em IA: pensamento crítico, criatividade, pensamento computacional, autoconsciência e consciência social, colaboração, comunicação e resolução de problemas.

“7 Competências de Literacia em IA” baseado nos princípios do AI Literacy Framework to Equip Youth in an Age of AI, da OCDE.
© Clara Vieira Rodrigues

A formadora

Clara Vieira Rodrigues é designer, investigadora e fundadora do projeto D!N (DESIGNEDIN), pioneiro em Design Centrado na Criança.

É docente no ensino superior, tendo já lecionando na Faculdade de Belas-Artes da Universidade do Porto e actualmente na Universidade do Minho, no Instituto de Educação e na Escola de Arquitetura, Arte e Design, onde trabalha temas como a literacia em IA em contextos educativosIA e co-criação e IA centrada na criança.

A Clara trabalha em design e tecnologia há mais de duas décadas, tendo vivido em Viena, na Áustria onde trabalhou na Siemens AG Österreich. Foi mentora no NEW INC do Museu de Arte Contemporânea de Nova Iorque. Fez formação Montessori, e desde 2022 especializou-se em design centrado na criança e nos seus direitos.
© Clara Vieira Rodrigues

Com uma abordagem inovadora e interdisciplinar, desenvolve programas que cruzam design, criatividade e tecnologia, promovendo o pensamento crítico e a literacia digital com especial enfoque nas crianças e jovens.

Tem particular interesse no co-design com crianças e jovens pois acredita nas suas capacidades para construirem um futuro mais inclusivo, criativo e sustentável. É consultora em design e tecnologia centrada na criança e membro da associação global sem fins lucrativos Designing for Children’s Rights (D4CR) que trabalha os direitos das crianças no desenvolvimento de produtos e serviços.

Participação na mesa-redonda da Educação, na conferência “Ser humano na era da inteligência artificial: Desafios da coexistência”, organizada pela Universidade Católica Portuguesa. 
© Imagem de cortesia

É também colunista de opinião sobre educação e parentalidade tecnológica no jornal PÚBLICO (ler artigo), e participa regularmente em workshops e conferências nacionais e internacionais sobre IA e inovação educativa (ler artigo).

Projeto Piloto no Colégio Alemão do Porto

Na aula aberta do KI-Kreativclub do Colégio Alemão do Porto, partimos de um objeto simples e tangível para as crianças, a banana 🍌, para explorar o diálogo entre arte contemporânea, o conceito de tempo e a tecnologia.

Abordamos o que é a Inteligência Artificial e enumeramos algumas aplicações e tecnologias de IA como a Alexa, a Siri, a Netflix, o Spotify, o Google Maps e, claro, o Chatgpt!

Inspiramo-nos em três obras emblemáticas onde a banana é o elemento central:

Andy Warhol — The Velvet Underground & Nico (1967) Capa de álbum com a indicação “Peel slowly and see”. A banana era um autocolante que ao ser retirado revelava o interior da banana, cor-de-rosa. O gesto trazia a dimensão de efemeridade e deterioração.

Stefan Sagmeister — Banana Wall (2008) Instalação tipografica com 10.000 bananas, dispostas de forma a desenhar uma mensagem. Com o passar dos dias, as bananas amadureciam e apodreciam, e a imagem alterava-se, a obra tornava visível a ação inevitável do tempo sobre a matéria.

Maurizio Cattelan — Comedian (2019) Banana colada na parede com fita adesiva, é considerada uma das obras contemporâneas mais importantes, actualmente em exibição em Serralves. O título reforça o caráter provocatório, disruptivo e non-sense da obra que gerou bastante debate internacional. Mais do que a banana, o que importa é o que provoca no público. É a arte enquanto comunicação e ação. A sua natureza perecível desperta reflexão sobre valor, efemeridade e conceito. A banana é trocada a cada 3 dias.

A partir deste percurso artístico, as crianças identificaram o fator tempo nas obras e foram convidadas a observar e agrupar bananas em diferentes estados de maturação — verdes, amarelas e castanhas — e a fazer registos fotográficos. Na aula seguinte, e a partir dessas imagens, treinaram um modelo de inteligência artificial que identifica o grau de amadurecimento de uma banana, criando um bananómetro. 📷🍌📏💻

Aula experimental com crianças do 1º ciclo, dos 6 aos 9, no Colégio Alemão do Porto
© Clara Vieira Rodrigues

Este exercício tornou um objeto quotidiano, tangível para as crianças, em algo mais, que contem o conceito intangível de tempo. Através da análise das obras de arte, esse conceito foi traduzido em algoritmos, simplificando a tecnologia e estimulando a observação crítica e criativa do mundo, a imaginação, a memória e a compreensão dos processos.

No final houve bananas para todos!! 🍌🍌🍌🍌🍌